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sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Tetsuo, the Iron Man & Save the Green Planet - A Experiência Final


O Cin'Surgente chega ao fim. Morte em grande estilo. Extreme experience. Asian cyberpunk! Futuro proibido. Cybiose primitiva. Dois filmes que se insurgem contra a Ficção-Científica otimista e escessivamente feliz do legado Star Trek. Nenhum progresso. Nenhum happy end. Enfim, nenhum conformismo ególatra. A esperança triunfante da Ficção-Científica é uma muleta para quem tem medo de trilhar caminhos à beira de abismos. Ao quebrar esses parâmetros mentais da prudência conformista chega-se a lugares que ambos os filmes, "Tetsuo - the Iron Man" (1989-Japão) e "Save the Green Planet" (2003-Coréia do Sul), chegaram: o zen do princípio da crueldade (crudus - indigesto). A estrutura cartesiana reduz-se às cinzas. O princípio de causalidade, tão caro à ciência, é desprezado. A separação entre sujeito e objeto, completamente ignorada. O tédio... ridicularizado! Experiência direta, imediata, não filtrada com a tecnologia e com alienígenas. E sim, como diz um provérbio zen: "só encontrará a sua vida aquele que a perdeu"! Voi lá!

Tetsuo - the Iron Man, ou a arte cruel de um cybionte primitivo zen - este filme de Shinya Tsukamoto é um magnífico tratado cinematográfico. Primeiro por ser cinema em sua mais intensa experiência: libertação da literatura. E, em segundo, por ser uma inquietante tese sobre a relação entre nós humanos e nossos artefatos: somos um círculo vicioso, ou fita de Möebius entre ser vivo e ser máquina. É por esta segunda via que trilharemos. Na interface humano/máquina somos realidade última: não há objetivos, resultados práticos, evolução ética ou mesmo aprimoramento estético. Nela qualquer domínio técnico é insuficiente. É uma téchne sem téchne, arte sem arte. É um duplo desprendimento de si próprio: se o nada é o próprio infinito, o infinito é propriamente nada. Esse duplo desprendimento é a relação extreita entre intuição (no entanto, uma intuição especial, pois está mais próxima possível da sexualidade - intuição sexual que simultaneamente capta a totalidade e a individualidade das coisas) e a consciência cotidiana (o cálculo que inspira e sustenta toda a "luta" diária). Ser humano/máquina não é uma simples especulação, mas experiência única que o intelecto não pode conceber. Somente é possível conhecer quem profundamente o ignorar. Pois deixa de ser uma perseguição por um resultado exterior ou interior, e torna-se uma experiência onde ambas as esferas se confundem. Desse modo tudo o que é anterior é constituído a posteriori. Tudo o que é histórico é constituido não-historicamente. São as condições para a formação de instintos - o filho nasce antes da mãe. Insólita noção de sucesso: é preciso que se afunde ao máximo nos próprios fracassos - superar os pensamentos. A techné genuína de Tetsuo não conhece nem fim nem intenção. Tetsuo é um deixar para trás tudo o que se tem e o que se é lançando-os ao futuro. É expectativa livre de intenções. Tudo o que se faz está feito antes que se saiba. Adaptação ao acontecer. Nenhum significado de imitação. Apenas absorto na sua ação. O terror é sua  criação autêntica. Sentimento terrorista desprendido de si mesmo. O/a criador/a não está presente enquanto criador/a, mas sim apenas enquanto criação. A morte como forma de vida. Não existindo qualquer distância entre o gesto de se esquivar e o de atacar. Não existindo qualquer distância entre o vivo e o autômato. Tudo é um mesmo vazio. Um reencontro da segurança ingênua do/a principiante absorvida como traço dominante de personalidade. Indiferença a tudo o que pode amedrontar. Assim, Tetsuo é um viver no mundo sempre preparado a abandoná-lo. A idéia da morte não lhe é mais perturbadora. Tetsuo domina a vida e a morte, o humano e a máquina, portanto está livre de todo temor. É mestre zen de uma arte cruel. Apenas revela o que tiver de revelar com atitudes, jamais com palavras. Tetsuo a extrema expressão de um cybionte primitivo zen.

Save the Green Planet, ou a Próxima Grande Aventura Póstuma da Humanidade - a visão de Jun-Huan Jeong, com este seu filme, é diabolicamente inteligente e inspiradora. Sua questão norteadora é terrível: do que estamos falando quando dizemos em salvar o mundo? É do planeta Terra em si? É do mundo animal, vegetal e mineral? É preservar as culturas como elas se encontram neste exato momento? Ou seria, simplesmente salvar o lugar onde habitam os humanos? Mas... salvar? De quê e/ou de quem? Da morte? Da dor? Do tédio? Da conquista? De outra pessoa? De mim mesmo/a? Save the Green Planet dá algumas dicas: absolutamente nenhum programa; a melhor maneira de não viver; anti-padrões de vida; a única forma certa de vida é incerta; corresponsabilidade de minhas misérias; cuidado com os bons selvagens; aversões e medos civilizados; nova história para velhas tragédias. Mas que tipo de dicas são essas que não ajuda em nada para respondermos a questão norteadora? Simples, o filme é um sistema complexo tal qual o tratado pela Teoria do Caos e suas idéias são meros estranhos atratores. Estes são pontos para os quais toda órbita que passar perto é atraída por eles. Nos sistemas caóticos esses pontos são denominados "estranhos", devido ao elevado grau de incerteza dos resultados desses sistemas. Ainda assim, não é possível entendê-lo. Pois bem, mais uma chance. O filme visa contrabalancear com estranhezas aquilo que desde já supomos como certa: é preciso salvar o mundo. Seu enredo é uma espécie de anarcopsicanálise antiedipiana, polissexualidade, esquizocultura e pânico diante a possibilidade do fim. A cada momento surge uma estranheza para aterrorizar nossas certezas que supostamente gosta da liberdade de expressão. Save the Green Planet não recalca desvios de comportamento nem reprime os ataques a sua própria consciência. É uma resposta poderosa sem os clássicos niilismos sorrateiros do ocidente: drogas free, surrealismo, New Wave, Nova Ordem Mundial, Terrorismo eco-capitalista, Turismo sustentável. Resposta poderosa por ser belamente ultrajante; não há nenhum novo paradigma social; não confirma nenhuma visão quântica ou existencialista; nenhum vazio budista; nenhum abismo nietzscheano; nenhum vazio da incerteza de Joyce; nenhum tipo de iluminação pela Relatividade Especial de Einstein; enfim, nenhum Produto Interno Bruto. Hã, não há milagres? Como assim? E agora, o que vamos fazer? Abandonar o barco? Tão próximo da margem... BUM!!! Um final maravilhoso? Não, obrigado.

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terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Libertárias - ou Um exército disposto a desaparecer


O registro da Guerra Civil Espanhola de 1936, desencadeada por um golpe militar, no filme as Libertárias cumpre duas finalidades primordiais. Uma, preservar na memória a luta de dimensão ideológica e a potência revolucionária de um povo que, organizado em frentes de resistência contra o fascismo, contra o autoritarismo e contra a moralidade católica. A outra trazer o legado da luta de milícias de mulheres que não apenas lutaram contra o autoritarismo, mas potencialmente contra a opressão feminina, tanto dos nacionais quanto dos republicanos.

O que é expressivo no filme é a dimensão de que as mulheres reivindicam e exigem o reconhecimento de serem “equivalentes” aos homens.

 “Somos equivalentes”. Essa a expressão mais simbólica das reivindicações das mulheres que organizadas em uma frente armada, com mais de 20.000 filiadas, travaram a trajetória para educar e libertar as mulheres da prisão da submissão, da escravidão e da maternidade reprodutiva.

A película nada tem de hiperrealidade, nem tampouco romantiza as personagens ou mesmo as idealiza. A representação provoca a compreensão das motivações ideológicas e sociais pelas quais lutavam. As mulheres foram vencidas e a dimensão da exclusão e da opressão se transformam na marca de uma cultura masculina de raiz católica e fascista.

O Estado, o exército, o latifúndio, a igreja e o capitalismo se preservam enquanto expressões máximas da opressão de gênero.

Mais do que um registro histórico, o filme produz os sentidos de uma concepção ainda presente da categorização de gênero que desqualifica e exclui as mulheres do espaço de vida pública e reafirma os modelos de aprisionamento ao espaço domestico não político.

Como pensar essa dimensão dissociada da idealização sócio-política da igualdade de gênero? Em práticas cotidianas de ódio ao sistema, ao autoritarismo masculino e à desumanidade de políticas e educação que impõe a acomodação, a apatia e a insensibilidade.

“Mujeres Libres” desafiaram o modelo e se negaram a reproduzir a dinâmica burguesa da submissão, da servidão e da moralidade católica que lhe impôs ô ônus da reprodução.

O registro do assassinato das mulheres que ainda resistiram no front de batalha foi registrado com a sutil dimensão da “equivalência”: 

As mulheres livres não têm medo... Não são poupadas... Não são vitimizadas... Não fogem e não se salvam, porque não são cristãs, não preferem a vida a qualquer preço. Preferem a morte a viver como escravas ou submissas. 

O que se revela a partir da luta das “Mujeres Libres” é a memória para todas as gerações de mulheres que decidiram entrar para a história pela luta e derrota pela morte, mas recompensadas por nunca terem se curvado ante aos opressores. 

Que nos inspire, pois, a realidade do passado está impregnada em nosso presente, pois também somos filhos e filhas da mesma e nefasta moralidade cristã, do autoritarismo político e do poder masculino hoje dissimulado em discursos educativos de que “juntos (sic) tudo é possível”.

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segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

El Topo - ou, Por uma Mística do Trágico

Superfície. Antes de cavar: Oeste dos Estados Unidos da América. Ante sala da Guerra Civil Americana. Ocupação de terras, criação de gado, luta com indígenas, segregação. Cowboy solitário, pistoleiros, aventureiros, jogadores, vagabundos errantes, xerifes, garimpeiros. Roupa do corpo, revólver, cavalo. Cavando um pouquinho: Jogatina, álcool, prostituição. Futuro glorioso à ferro e fogo, ideais patrióticos, presença militar dos colonizadores. História linear, enredos vazios, moral imperiosa. Civilização como um bem a ser alcançado. Ahá encontrei algo. Ei, isso é o Western, um tipo de cinema estadounidense por excelência! 

Bem, deixa eu cavar um pouco mais e entrar mais a fundo no Western. Estimulante e anestesia ancestral inextirpável do judáico-cristianismo-europeu: o ser humano pode agir sobre seu destino; ele não é mais um joguete dos deuses pagãos; sob a insígnia do Deus único o ser humano age sobre si mesmo, bastando apenas, lutar ferozmente contra os três grandes demônios que exercem domínio cruel sobre sua existência: o artifício, a natureza e o acaso. O primeiro grande demônio, o artifício (tudo o que é múltiplo - no caso, materializado como diversas sabedorias indígenas), deve ser moralizado. Pois o artifício, não tem regras; é um capricho arbitrário; é filho da faculdade de resolver e decidir e, portanto, uma injustiça. O segundo, a natureza deve ser domada. Pois a natureza sempre foi considerada como uma forma eficaz contra toda forma de superstição e de crença religiosa. A natureza é filha de nenhum princípio gerador - perigo absoluto para qualquer cristão. Desse modo, domada a natureza é apenas demanda das terras prometidas aos mórmons e demanda destinada à reforma agrária europeia além mar. O terceiro grande demônio é o pior de todos! E assim, deve ser aniquilado sem dó nem piedade. É o acaso. Risco perigosíssimo, pois nele tudo foge do controle. É a própria insignificância radical de todo acontecimento, de todo pensamento e de toda existência. Fonte invisível de tudo o que nos desagradam, pois pode se admitir tudo, menos o acaso. Neste a civilização chegada ao novo mundo é, nada mais nada menos, do que um destino lamentável. (Ah, lembremos: esse fundo a que cheguei não é privilégio somente dos Estados Unidos, muito menos do Western.)

E agora? Já estou bem fundo... Opa, acho que alguém está se aproximando... Parece que está vindo por baixo... Ah! É uma topeira! Helo my friend! 

- Hola mi amico! Yo soy el Topo!

- El Topo? Español? Entonces tu no habla inglês? 

- Inglês? No. Pero, infelizmente, hablo la lengua de otro colonizador.

-  Ah, entiendo. Eu também falo a de outro... mas el Topo, o que te trazes até aqui?

- Si, esta es una longa história. Pero yo hablaré a ti em tu lengua también no originária. Minha história é  a seguinte:

Minha trajetória é dupla. A primeira se situa no real, porém na forma de um manifesto (não surreal) contra o homoreligious, esta absurda disciplina de viver à sombra de Deus; esta grande segunda chance que ocultou a crueza do trágico irreversível de nossa existência. A segunda é o duplo da primeira: uma espécie de ilusão oracular. O ardil e a ironia dos efeitos do real: o homonaturalis, esta absurda disciplina de viver às sombras da promessa de explicação, que supera o homoreligious abandonando o heterocídio em prol do suicídio: o nada que decidiu a forma de existência que observamos.  

Meu manifesto, minha primeira trajetória é indiferente à própria ideia de causa; a existência não tem nenhuma essência que a fundamente: nenhuma dissimulação nem mistério. O deserto é minha paisagem mais própria. Minha indiferença é meu tipo na certeza de que a única causa possível é o acaso: o único apto a trilhar mil caminhos possíveis. É preciso enterrar a mãe. Desse modo, sem mesmo a imagem da mãe, o acaso é a melhor arma contra o desejo de elevação típico do absurdo homoreligious. Este desejo danoso que recusa a admitir que nossa existência é um produto sem causa nem desígnio, ou seja, toda dor ou tédio que sentimos é apenas dor e tédio. Troco a convivência com meu filho pela convivência com uma estranha. A partir daí a  possibilidade de ficar cego, ao chegar à superfície, é somente um das possibilidades. No entanto, há o dever de obediência, ou seja, o querer cegar-se, o estranho desejo de ficar cego. Pois este dever/desejo seria a própria crença de que o melhor modo de ver as coisas é a cegueira: ambição obsessiva de dar conta do conjunto das coisas conhecidas e desconhecidas ao mesmo tempo. O ver mais geral. O ver acima. É contra esse tipo de ver sobre a natureza (visão sobrenatural) do homoreligious, que eu, el Topo, se insurge. Foi preciso matar seus mestres. Superá-los até a indiferença. Insurgência trágica contra o credo comum de toda denegação filosófica, científica ou religiosa da realidade. Denegação que oculta o caráter único da vida, mantendo-a à distância de sua falta irremediável de recursos de conforto exterior a ela. Denegação que visa atenuar o rigor de existir. Trágica pois sua realidade é suficiente e tem a plena certeza de seu nada constitutivo. Não é um mal terrível nenhuma ver as coisas tal como elas se apresentam: heterocídio.

A segunda trajetória, como Dionísio ou Renato, ambos nascidos novamente, acordo em uma caverna como algum tipo de salvador. Venerado, cuidado e esperado como alguém detentor de uma grande resposta. No entanto, esta "segunda chance" me é o próprio ato de evitar o destino coincidindo como a sua própria realização: suicídio - tentativa de extirpar o inextirpável, a morte. Um e mesmo gesto: o fatal (a caverna) e o da esquiva (a cidade da superfície). A tentativa de se eliminar o acontecimento (a morte), elimina apenas uma de suas versões (velhice, doença, acidente, heterocídio, suicídio). A frustração do acontecimento (preconceito naturalista) é a mesma da expectativa do acontecimento (preconceito divinista). A pedagogia moral (processo) é a mesma consciência moral (resultado). Ao mesmo tempo que exponho o criminoso, me exponho como o criminoso. Coincidência rigorosa. Círculo tautológico. Renascido a força natural nem é inércia material nem é o poder humano de intervenção, tampouco é alguma coisa pensada e definida. O filho resurge em seu desejo de matar o pai. Mas sua morte pode ser adiada até que seu trabalho platônico termine. No entanto o privilégio de não existir já foi negado a todos/as. À necessidade da morte é impossível de se escapar. Não há disfarces. Nada acrescentará algo à vida. Não é possível ter mais vida. A vida somente se torna vida se disfarçada de morte: travestida. A eficácia da ideia de se ter mais vida, ou outra vida, é proporcional à seu travestimento, em outras palavras, à sua imprecisão. Somente travestida, ou seja, somente imprecisa a idéia de "mais vida" torna-se invulnerável. Essa minha segunda trajetória, torno-me, el Topo, o grande inimigo da crença. Não enquanto verdade, e sim, enquanto precisão: somente é invencível aquilo que não existe.

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