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domingo, 5 de setembro de 2010

Sociedade do Espetáculo - ou, a narração da Ontologia do Vazio

Guy Debord, filósofo, cineasta e Internacional Situacionista. Sociedade do Espetáculo, livro e filme. Enquanto livro, palavras. Palavra atada ao seu respectivo significado. Porém, composta em aforismos paráfrases,  em deturpação revolucionária. Seu tipo de escrita incita quem lê a decifrar a visibilidade de suas idéias. Alastramento. Ação de vaguear. Ato errante. Aventurar-se. Propagação. No livro, Guy Debrod mergulha seu pensamento nos diálogos das ilusões que recusam o real. Recusa que está a meio caminho da cegueira voluntária de Édipo Rei e a estranha aptidão humana de substituir uma besteira por outra como se fosse algo indispensável ao psiquismo. Diálogos entre ilusões: o abuso público e individual cotidiano de uma visão de mundo dialogando com o produto das técnicas de difusão massiva de uma visão de mundo. Cínica simbiose entre emissor e receptor. No livro, a palavra critica a imagem. Esta cujo poder é magistralmente conduzir nossa natureza irracional. Pois a palavra é tardia. É razão. É quem tem a necessidade de precisar a imagem. É quem tem a necessidade de configurá-la em discurso. Uma só image é um discurso em si. Mas o encadeamento de várias delas é estruturalmente intencional. Assim, eis que surge a necessidade de Guy Debord em voltar a um estágio relacional primário da imagem: o cinema!

Guy Debord faz do livro um filme. Sociedade do Espetáculo onde as palavras são filtradas pela filmagem. Filtragem apropriada. Resignificada. Deturpada em dupla ausência irremediável dos corpos representados.  Um jogo de espelhos da liquidação mágica de qualquer realidade. Um  jogo de espelhos que reflete muito mais do que o reflexo. Um jogo de espelhos que provoca o imaginário. Um jogo de espelhos que intima a interpretação às situações patentes e latentes de quem alí é refletido. O espectador vê-se em  primeira e terceira pessoa ao mesmo tempo. No entanto, não se vê enquanto indivíduo (impossível de divisão), se vê como a própria percepção do vazio do eu (adesão de um certo eu a um certo algo). Na imagem duplamente refletida do filme, Narciso não se vê, não se encanta por si. Narciso se vê enquanto pura consciência impessoal do social. Seu reflexo é propriamente um imaginário espetacular. Aí se encanta. Só se é único enquanto mímeses de seu meio coletivo. Um sujeito incerto ligado a um objeto indeterminado. Uma atenção exagerada ao outro.

O filme é um meta-filme de um cineasta que nada filma, é apenas narrador. Narração sem paixões - paixões sem objeto concreto, como qualquer paixão. Pois é narrador de uma ontologia do vazio. Tudo o que está aí é propriamente o não-ser - núcleo vazio de todo dever-ser. Tudo o que está aí é propriamente coisa que pode vir a existir. O estado natural do ser: nada e tempo. Um órgão que não pode ser removido do corpo. Tudo o que está aí é um desejo de coisa nenhuma. Uma inspiração por coisas vagas. Uma arquitetura mediadora para ocultar a angústia face à existência - .não-ser é um mal menor pois tem-se a garantia que ao menos foi algo. Um preciptar de acontecimento. Porém, preciptação de fortaleza inexpugnável. O espetáculo capaz de frustrar qualquer possibilidade de ataque. Espetáculo que tem uma sociedade inteira que lhe permite afrontar, qualquer questão e crítica, de modo sereno. Sociedade do espetáculo, o filme, a narração do excesso paranóico de racionalidade da própria sociedade do espetáculo.

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