El Topo - ou, Por uma Mística do Trágico

Bem, deixa eu cavar um pouco mais e entrar mais a fundo no Western. Estimulante e anestesia ancestral inextirpável do judáico-cristianismo-europeu: o ser humano pode agir sobre seu destino; ele não é mais um joguete dos deuses pagãos; sob a insígnia do Deus único o ser humano age sobre si mesmo, bastando apenas, lutar ferozmente contra os três grandes demônios que exercem domínio cruel sobre sua existência: o artifício, a natureza e o acaso. O primeiro grande demônio, o artifício (tudo o que é múltiplo - no caso, materializado como diversas sabedorias indígenas), deve ser moralizado. Pois o artifício, não tem regras; é um capricho arbitrário; é filho da faculdade de resolver e decidir e, portanto, uma injustiça. O segundo, a natureza deve ser domada. Pois a natureza sempre foi considerada como uma forma eficaz contra toda forma de superstição e de crença religiosa. A natureza é filha de nenhum princípio gerador - perigo absoluto para qualquer cristão. Desse modo, domada a natureza é apenas demanda das terras prometidas aos mórmons e demanda destinada à reforma agrária europeia além mar. O terceiro grande demônio é o pior de todos! E assim, deve ser aniquilado sem dó nem piedade. É o acaso. Risco perigosíssimo, pois nele tudo foge do controle. É a própria insignificância radical de todo acontecimento, de todo pensamento e de toda existência. Fonte invisível de tudo o que nos desagradam, pois pode se admitir tudo, menos o acaso. Neste a civilização chegada ao novo mundo é, nada mais nada menos, do que um destino lamentável. (Ah, lembremos: esse fundo a que cheguei não é privilégio somente dos Estados Unidos, muito menos do Western.)
E agora? Já estou bem fundo... Opa, acho que alguém está se aproximando... Parece que está vindo por baixo... Ah! É uma topeira! Helo my friend!
- Hola mi amico! Yo soy el Topo!
- El Topo? Español? Entonces tu no habla inglês?
- Inglês? No. Pero, infelizmente, hablo la lengua de otro colonizador.
- Ah, entiendo. Eu também falo a de outro... mas el Topo, o que te trazes até aqui?
- Si, esta es una longa história. Pero yo hablaré a ti em tu lengua también no originária. Minha história é a seguinte:
Minha trajetória é dupla. A primeira se situa no real, porém na forma de um manifesto (não surreal) contra o homoreligious, esta absurda disciplina de viver à sombra de Deus; esta grande segunda chance que ocultou a crueza do trágico irreversível de nossa existência. A segunda é o duplo da primeira: uma espécie de ilusão oracular. O ardil e a ironia dos efeitos do real: o homonaturalis, esta absurda disciplina de viver às sombras da promessa de explicação, que supera o homoreligious abandonando o heterocídio em prol do suicídio: o nada que decidiu a forma de existência que observamos.
Meu manifesto, minha primeira trajetória é indiferente à própria ideia de causa; a existência não tem nenhuma essência que a fundamente: nenhuma dissimulação nem mistério. O deserto é minha paisagem mais própria. Minha indiferença é meu tipo na certeza de que a única causa possível é o acaso: o único apto a trilhar mil caminhos possíveis. É preciso enterrar a mãe. Desse modo, sem mesmo a imagem da mãe, o acaso é a melhor arma contra o desejo de elevação típico do absurdo homoreligious. Este desejo danoso que recusa a admitir que nossa existência é um produto sem causa nem desígnio, ou seja, toda dor ou tédio que sentimos é apenas dor e tédio. Troco a convivência com meu filho pela convivência com uma estranha. A partir daí a possibilidade de ficar cego, ao chegar à superfície, é somente um das possibilidades. No entanto, há o dever de obediência, ou seja, o querer cegar-se, o estranho desejo de ficar cego. Pois este dever/desejo seria a própria crença de que o melhor modo de ver as coisas é a cegueira: ambição obsessiva de dar conta do conjunto das coisas conhecidas e desconhecidas ao mesmo tempo. O ver mais geral. O ver acima. É contra esse tipo de ver sobre a natureza (visão sobrenatural) do homoreligious, que eu, el Topo, se insurge. Foi preciso matar seus mestres. Superá-los até a indiferença. Insurgência trágica contra o credo comum de toda denegação filosófica, científica ou religiosa da realidade. Denegação que oculta o caráter único da vida, mantendo-a à distância de sua falta irremediável de recursos de conforto exterior a ela. Denegação que visa atenuar o rigor de existir. Trágica pois sua realidade é suficiente e tem a plena certeza de seu nada constitutivo. Não é um mal terrível nenhuma ver as coisas tal como elas se apresentam: heterocídio.
A segunda trajetória, como Dionísio ou Renato, ambos nascidos novamente, acordo em uma caverna como algum tipo de salvador. Venerado, cuidado e esperado como alguém detentor de uma grande resposta. No entanto, esta "segunda chance" me é o próprio ato de evitar o destino coincidindo como a sua própria realização: suicídio - tentativa de extirpar o inextirpável, a morte. Um e mesmo gesto: o fatal (a caverna) e o da esquiva (a cidade da superfície). A tentativa de se eliminar o acontecimento (a morte), elimina apenas uma de suas versões (velhice, doença, acidente, heterocídio, suicídio). A frustração do acontecimento (preconceito naturalista) é a mesma da expectativa do acontecimento (preconceito divinista). A pedagogia moral (processo) é a mesma consciência moral (resultado). Ao mesmo tempo que exponho o criminoso, me exponho como o criminoso. Coincidência rigorosa. Círculo tautológico. Renascido a força natural nem é inércia material nem é o poder humano de intervenção, tampouco é alguma coisa pensada e definida. O filho resurge em seu desejo de matar o pai. Mas sua morte pode ser adiada até que seu trabalho platônico termine. No entanto o privilégio de não existir já foi negado a todos/as. À necessidade da morte é impossível de se escapar. Não há disfarces. Nada acrescentará algo à vida. Não é possível ter mais vida. A vida somente se torna vida se disfarçada de morte: travestida. A eficácia da ideia de se ter mais vida, ou outra vida, é proporcional à seu travestimento, em outras palavras, à sua imprecisão. Somente travestida, ou seja, somente imprecisa a idéia de "mais vida" torna-se invulnerável. Essa minha segunda trajetória, torno-me, el Topo, o grande inimigo da crença. Não enquanto verdade, e sim, enquanto precisão: somente é invencível aquilo que não existe.
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